Marcio A. Lauria de M. Monteiro[1]
Stephanie Christina Heyer Bustamante[2]
No presente trabalho
buscaremosrealizar uma breve discussãoda realidade brasileira atual a partir do
eixo “Educação e Trabalho”. Para tal, utilizaremos algumas reportagens recentes
sobre educação como uma forma de compararmos dados atuais com pressupostos
legais presentes nasLeis de
Diretrizes e Bases da educação Brasileira (LDB – BRASIL, 1996). Nossa
discussão terá por base os estudos de Azevedo (2011), Höfling (2001) e Martins
(2009).
A partir do Artigo II
da LDB, podemos verificar dois eixos através dos quais o tema “Educação e
Trabalho” é abordado na lei em questão: (1) educação como exercício de
cidadania e (2) educação como qualificação para o mercado de trabalho. A lei 9.394 procura garantir os fundamentos e
bases para que esses dois eixos sejam complementares. Contudo, o que
verificamos no decorrer das análises é a dicotomia entre educação acadêmica voltada para a classe média e alta, através de
cursos de nível superior e bacharelado, contrapondo-se a orientação ou estímulo
da educação técnicae/ou tecnológica
para setores sociais mais baixos.
Dessa forma, a formação
técnica ganha destaque como opção de educação paralela ao ensino médio, onde o
projeto de qualificação de mão-de-obra é privilegiado em detrimento da efetiva
inclusão de determinados setores sociais no nível superior de educação. Em muitos sentidos, isso é mais um aspecto
reprodutor da dualidade social que certos estudos indicam existir no sistema de
ensino brasileiro, dividido em setores para a população trabalhadora e de renda
inferior e de setores para as classes médias e altas (AZEVEDO, 2011).
O “boom” do crescimento
da oferta dos cursos técnicos promovidos pelo Estado através dos Centros
Federais de Educação Tecnológica(CEFET), Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia (IFET), assim
como por suas versões locais (i.g., Fundação
Apoio Escola Tecnológica Rio de Janeiro – FAETEC) ou mesmopor entidades
privadas como as pertencentes ao “Sistema S”, legitima o modelo de educação que
visa atender diretamente as necessidades de determinadas empresas privadas no
mercado de trabalho. Dessa forma, os cursos técnicos e tecnólogos aparecem como
opções de rápida inserção no mercado, se configurando cada vez mais como meros
espaços de formação de mão de obra.
É o que podemos depreender,
por exemplo, do seguinte trecho de uma notícia de 2012:
Alguns
cursos qualificam o jovem ou adulto a entrar direto no mercado de trabalho, com
conhecimento teórico e prático nas diversas atividades do setor produtivo. Há opções que duramapenas dois meses. (Jornal Hoje – G1 Globo.com, nossa ênfase)
Seguindo a tendência de
ampliar as possibilidades e ofertas educacionais, porém sem que isso implique
uma melhoria qualitativa do ensino ofertado, o Brasil também tem presenciado a
expansão de cursos superiores na modalidadede Ensino à Distância (EAD),
conforme relatado por Oscar Hipólito no jornal O Estado de São Paulo (2012).
Inserido no contexto
neoliberal, no qual o Estado não é o único responsável pela oferta educacional,
diversas empresas privadas ampliaram a oferta de cursos à distância voltados
para setores sociais que não conseguem inserção no nível educacional público ou
que já possuem emprego e não dispõe de oportunidades ou tempo para frequentarem
uma modalidade de ensino presencial.
Novamente, a ampliação
dessas ofertas é vista como forma de direcionar uma mão-de-obra (pré)existente
para qualificação de modo a atender a demanda do mercado capitalista. O tema da
educação à distância como uma nova realidade presente em diversos países,
transmite a responsabilidade da inserção social através da educação para
empresas privadas que detêm majoritariamente a maior oferta desses cursos.
Nota-se, assim, uma
competição pelo monopólio da educação, uma vez que ambas as esferas, pública e
privada, não detém a exclusividade na prestação do serviço.
Dessa forma, podemos
entender que a livre escolha que o indivíduo exerce entre as opções
educacionais existentes é, na verdade, condicionada ao lugar social que esse
indivíduo ocupa na estrutura social (HÖFLING, 2001, p. 38), sendo o resultado
alcançado vendido como produto da ideologia meritocrática.
Outro eixo de ação que
visa a não-modificação da estrutura educacional são as inúmeras realizações de
ações afirmativas, tanto para concursos
de nível médio/superior como em concursos em empresas de prestação de serviços
públicos.Estas ao nosso ver, são medidas paliativas e que não chegam sequer
perto da oferta de vagas necessária para que haja a propagandeada reparação
histórica a qual elas se destinariam, em termos de diminuição das desigualdades
sociais.
Uma reportagem de 2011
da Revista Veja relata o avanço da política de cotas para outras esferas além
da educacional (“[...]as
cotas não estarão mais restritas às universidades e incluirão ações no mercado
de trabalho”).
A partir dessa rápida exposição, podemos ver como que a grande
desigualdade social existente hoje no Brasil se reflete na relação entre
Educação e Trabalho.Ao mesmo tempo em que se produz e reproduz uma dualidade
dentro do sistema educacional, marcada por uma divisão social classista entre
as diferentes modalidades educacionais, também se fortalece cada vez mais a
lógica de uma educação rápida destinada à formação de mão de obra
(semi)qualificada.
Essa tendência ao fortalecimento de uma educação ditada pelas
necessidades do mercado e sua reprodução até mesmo dentro do sistema público de
ensino, é um indício da inserção cada vez maior dos interesses do empresariado
nas forças que ditam os rumos da educação brasileira. Por outras vias, Martins
(2009) já havia demonstrado essa tendência.
Consequentemente, podemos ver como que, na atual realidade brasileira, a
relação educação-trabalho é fortemente marcada pelos interesses de mercado e
como que ela reflete a estratificação social do país e a reprodução dessa
estratificação a partir da educação. Mais especificamente, práticas políticas e
econômicas que visam a colocação direta do indivíduo no mercado de trabalho,
estimulando o seu lugar de produtor e consumidor, mas não o de cidadão crítico.
Logo, concluímos que a articulação proclamada na lei entre a educação
“como exercício de cidadania” e como “qualificação para o mercado de trabalho”
ainda está muito longe de passar da retórica para a realidade.
Bibliografia
AZEVEDO,
Janete Maria Lins de. O Estado, a política educacional e a regulação do setor
da educação no Brasil: uma abordagem histórica. IN: Gestão da Educação: impasses, perspectivas e compromissos.
FERREIRA, NauraSyriaCarapeto e AGUIAR, Marcia Angela da S. (orgs.). São Paulo:
Cortez, 2011.
BRASIL. Lei
Nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Disponível
em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9394.htm. Acessado em 3 de março
de 2013.
HÖFLING, Eloisa de Mattos. Estado e
Políticas (Públicas) Sociais. IN: Cadernos
Cedes, ano XXI, nº 55, novembro/2001.
MARTINS, André Silva. A educação básica
no século XXI: o projeto do organismo “Todos pela educação”. IN: Práxis Educativa, Ponta Grossa, v. 4, n.
1, p. 21-28, jan.-jun. de 2009. Disponível em
http://www.researchgate.net/publication/26848434_A_educao_bsica_no_sculo_XXI_o_projeto_do_organismo.
Acessado
em 3 de março de 2013.
Fontes
HIPÓLITO, Oscar. O Estado de São Paulo. Educação a distância: uma nova realidade.31/05/2012 - São
Paulo, SP. Disponível em http://politicaseducacionaisnaimprensa.blogspot.com.br/2012/05/educacao-distancia-uma-nova-realidade.html.
Acessado em 3 de março de 2013.
Jornal Hoje – G1 Globo.com. Formação técnica ganha destaque entre os
profissionais brasileiros.04/06/2012 - Rio de Janeiro, RJ.
Disponível em politicaseducacionaisnaimprensa.blogspot.com/2012/06/formacao-tecnica-ganha-destaque-entre.html?spref=tw.
Acessado em 3 de março de 2013.
Revista Veja. Cotas raciais podem
chegar ao mercado de trabalho. Da Redação
– 29/05/2012 – São Paulo, SP. Disponível em
http://politicaseducacionaisnaimprensa.blogspot.com.br/2012/05/cotas-raciais-podem-chegar-ao-mercado.html.
Acessado em 3 de março de 2013.
*Trabalho final da disciplina Educação Brasileira, prof. Armando Arosa, Período
2012/2, da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
[1] Graduando do 8º período do
Bacharelado e Licenciatura Plena em História da Universidade Federal do Rio de
Janeiro (DRE 109060430).
[2] Graduanda do 9º período do
Bacharelado e Licenciatura Plena em História da Universidade Federal do Rio de
Janeiro (DRE 108055270).