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Politicas educacionais na imprensa

14 de jul. de 2016

A FORMAÇÃO DOS PROFESSORES ATRAVÉS DE UMA PERSPECTIVA MIDIÁTICA

A FORMAÇÃO DOS PROFESSORES ATRAVÉS DE UMA PERSPECTIVA MIDIÁTICA
Cláudio B. dos Santos 1
Igor Sanches 2
Natália Machado 3
Sônia Matheus 4
Introdução

Vivemos uma realidade de caos na educação brasileira. Diversas vozes aparecem para mostrar soluções e apresentar problemas. Entretanto, na maioria dos casos elas apontam em direção à formação docente. Seria a formação docente a causa da crise na educação brasileira e sua possível solução? Ou a ineficácia da educação brasileira influenciaria a profissão docente? Assim, este trabalho busca constatar o que se fala sobre a formação docente, através da perspectiva dos meios de comunicação, focando na sua crítica a este tema.
A mídia brasileira ocupa um papel de intermediário entre a sociedade e a informação. Buscando resguardar seus interesses, ela julga, emite sentenças e manipula resultados. Seu papel, portanto, não seria diferente ao informar sobre a formação docente, assumindo uma perspectiva tendenciosa ao criticar a formação dos professores.
Este artigo é fruto de uma investigação realizada na disciplina Profissão Docente, lecionada pelo Professor Armando Arosa, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, utilizando como fonte principal o blog Políticas Educacionais na Imprensa (Disponível: politicaseducacionaisnaimprensa.blogspot.com.br.)

O discurso e a prática
Vivemos um contexto no qual para pregar o civismo ou para imaginar o futuro (Nóvoa, 1999), nada melhor do que falar sobre a educação. Assim sendo, a educação é tida como o caminho para um futuro melhor de um país. Logo, é em direção aos professores que os discursos políticos se viram quando não encontram respostas para os problemas (Nóvoa, 1999).
Nóvoa (1999) afirma que no século em que vivemos não se percebe a aparição de novas propostas para a profissão docente, mas apenas assomam questionamentos dúbios sobre a profissão. Segundo Nóvoa (1999), os professores tendem a ser olhados com:
Desconfiança, acusados de serem profissionais medíocres e de terem uma formação deficiente; por outro lado, são bombardeados com uma retórica cada vez mais abundante que os considera elementos essenciais para a melhoria de qualidade do ensino e para o progresso social e cultural. (Nóvoa, 1999, p.14)
Como podemos observar na citação acima, esta é a exata realidade de nosso país. A sociedade acredita numa deficiência na formação docente, mas também vê os professores como a saída para um futuro melhor.
Tendo em vista esta realidade, os discursos políticos e os planos nacionais de educação para a melhoria do ensino no Brasil, o Ministério da Educação, através do Presidente do Conselho Nacional de Educação, publica a Resolução nº 2, de primeiro de julho de 2015 que implementa políticas na formação de professores. O artigo primeiro dessa resolução, afirma que:
Art. 1º Ficam instituídas, por meio da presente Resolução, as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial e Continuada em Nível Superior de Profissionais do Magistério para a Educação Básica, definindo princípios, fundamentos, dinâmica formativa e procedimentos a serem observados nas políticas, na gestão e nos 3 programas e cursos de formação, bem como no planejamento, nos processos de avaliação e de regulação das instituições de educação que as ofertam. (CNE, 2015)
Como podemos ver no artigo acima, a resolução afirma que a formação de professores precisa ser observada em todos os níveis em que se apresenta. O documento propõe uma reformulação da profissão docente buscando atender à meta 15 do Plano Nacional de Educação de 2014 (Lei 13.005/2014) que institui o seguinte:
Meta 15: garantir, em regime de colaboração entre a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios, no prazo de um ano de vigência deste PNE, política nacional de formação dos profissionais da educação de que tratam os incisos I, II e III do caput do art. 61 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, assegurado que todos os professores e as professoras da educação básica possuam formação específica de nível superior, obtida em curso de licenciatura na área de conhecimento em que atuam. (Brasil, 2014)
A meta acima repercutiu na mídia, que buscou associar a adequação das licenciaturas com índices de proficiência das escolas no Exame Nacional do Ensino Médio.
Metodologia
O foco inicial da pesquisa foi direcionado para a formação docente. Começamos a busca pelo blog Políticas Educacionais na imprensa (Disponivel em: politicaseducacionaisnaimprensa.blogspot.com.br), sugerido pelo professor, porém encontramos poucas matérias, cujos conteúdos não se encaixavam nesse primeiro foco. Então, partimos para outras fontes, como o G1 (Disponível em: http://g1.globo.com/) e Folha de S. Paulo (Disponivel em: http://www.folha.uol.com.br/), entre outros sugeridos pelo professor, como o clipping do site Todos Pela Educação (Disponível em: http://www.todospelaeducacao.org.br/educacao-na-midia/indice/) e o blog Clipping de Educação (Disponível em: http://clippingdeeducacao.blogspot.com.br/).
Ao todo, coletamos 25 matérias, dentre as quais seis foram descartadas, pois não se adequavam ao foco estabelecido, que passou a ser a análise da crítica à formação de professores feita por estes veículos. Utilizamos muitas fontes, pois matérias voltadas para esse tema foram muito poucas, sendo assim, concordamos numa divisão na qual cada integrante focaria numa fonte, podendo aproveitá-lo ao máximo e explorá-los bem.
Para adequar-se ainda mais ao tema, escolhemos matérias publicadas durante o período entre 2014-2015, quando houve a implantação do novo PNE (Brasil, 2014) com novas propostas para a formação docente e a publicação de uma nova resolução para atender as metas propostas (CNE, 2015), dois fatos de extrema importância para a política educacional que repercutiram na mídia.
Utilizando as propostas do PNE (Brasil, 2014) e a resolução número 2 (2015) do CNE construímos o trabalho proposto, tendo como base teórica o artigo Os professores na virada do milênio: do excesso dos discursos à pobreza das práticas, de Antônio Nóvoa (1999). O autor problematiza e discute as políticas de avaliação de qualidade de ensino tendo somente como objeto de estudo a formação docente.
Análise
A investigação, como exposto na seção acima, contou com um corpus de 19 matérias, retiradas de diversos veículos, sendo eles O Globo, G1, Folha de São Paulo, Todos pela Educação (Disponível em: http://www.todospelaeducacao.org.br/), Estadão (Disponível em: http://educacao.estadao.com.br/), O site oficial da Câmara dos deputados (Disponível em: http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/EDUCACAO-E-CULTURA), Porvir.org, o jornal Estado de Minas (Disponível em: http://www.em.com.br/especiais/educacao/), Portal Brasil (Disponível em: http://www.brasil.gov.br/), Tribuna Hoje (Disponível em: http://www.tribunahoje.com/educacao), Universia (Disponível em: http://noticias.universia.com.br/educacao#) e Terra – Educação (Disponível em: https://noticias.terra.com.br/educacao/). Das dezenove matérias coletadas, seis foram publicadas em 2014 e 13 foram publicadas no ano de 2015.
Encontramos nas matérias coletadas quatro principais focos relacionados à formação dos professores, sendo estes (I) formação docente e ENEM; (II) formação inicial e continuada; (III) necessidade de integração entre o ensino básico e o superior, com vista a melhorar a capacitação dos docentes e (IV) análises, feitas a partir de pesquisas produzidas em sua maioria por entidades não governamentais, que associam a deficiência educacional do país à má formação docente. Nas seções abaixo faremos uma breve análise do conteúdo destas matérias, divididas pelos focos que aqui estabelecemos:
Formação docente e ENEM
Duas matérias, uma publicada pelo G1 e outra publicada pela Folha de São Paulo apontam que as escolas que possuem as maiores porcentagens de professores com licenciatura nas áreas nas quais se dedicam apresentam melhores índices no Exame Nacional do Ensino Médio. As matérias apontam que em 88% dos colégios que tiveram as melhores médias no exame, mais de 50% dos professores possuem a licenciatura adequada. Os veículos baseiam-se nos dados publicados pelo INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira).
Ainda acerca da adequação da licenciatura, uma das matérias do portal Todos pela Educação, com base nos dados levantados pelo Observatório do PNE, mostra que 51,7% dos professores do Ensino Médio não possuem a licenciatura adequada, entretanto, 95,3% possuem grau superior de formação. Essas análises publicadas pela mídia não são gratuitas, visto que adequar o professorado nas licenciaturas nas quais ministram é umas das metas do PNE 2014.
Como se vê, ao menos para o G1, para a Folha de São Paulo e para o portal Todos pela Educação, excelência na educação passa pela adequação dos professores em licenciaturas nas disciplinas que lecionam.
Formação Inicial e Continuada
Em nossa busca, coletamos dez matérias acerca deste tema que, como é um dos principais pontos do PNE 2014, além da adequação da licenciatura, a mídia dedicou uma grande quantidade de matérias para informar sobre os planos governamentais para a formação inicial e continuada e propõem, em coro com os documentos oficiais, um programa de residência docente. Nóvoa (1999) afirma que as grandes organizações internacionais, como Unesco, OCDE e União Europeia, buscam cunhar “o conceito de centralidade dos professores” (Nóvoa, 1999). Para estes organismos, a “centralidade dos professores nem sempre é devidamente reconhecida no plano político” (OCDE, 1998 in: Nóvoa, 1999). Portanto, estas organizações apostam na pressão política, visando o planejamento de políticas de formação inicial e continuada do professorado, que seriam julgados através de sistemas de acreditação e de lógicas de avaliação que no fundo carregam uma “concepção escolarizada da formação do professor”.
Contudo, a criação e aplicação destas medidas acabam por criar um mercado rentável que lucra a partir da defasagem da formação do professor, como a recente abertura das faculdades de Linguagem, Ciências da Natureza e Ciências Humanas, pelo SESI-SP, como noticiado na matéria de 24 de julho de 2014 do site Universia – Brasil. O curso nestas faculdades, informa o superintendente do SESI para o estado de São Paulo, Walter Vicioni, terá foco na licenciatura e contará com um sistema de residência, no qual o estudante matriculado em qualquer uma destas faculdades trabalhará para o próprio SESI recebendo um salário médio de escola particular.
A integração entre ensino superior e ensino básico
Duas matérias, dentre as coletadas, discutem a problemática da relação entre o ensino superior e o ensino básico. Uma apresenta uma entrevista feita pelo Todos pela Educação com o pesquisador Fernando Abrucio, da Fundação Getúlio Vargas que afirma que a melhoria na formação docente passa pela maior integração entre o tripé: universidades, redes de ensino e escolas.
Para Nóvoa (1999), os momentos fortes de produção de um saber científico pedagógico são também um momento forte de afirmação profissional dos professores, contudo, segundo o autor, esses momentos possuem também os “germes de uma desvalorização dos professores enquanto produtores de saberes”, investindo a “novos grupos de especialistas que se assumem como autoridades científicas”. Desapossar os professores de seus saberes, conclui o autor, “serve [a] objectivos de desenvolvimento da carreira dos universitários”
A mídia incorpora esta deslegitimação, e as matérias servem de exemplo, ao preferir entrevistar um especialista universitário que não possui o contato com a sala de aula.
Má formação e deficiência na educação.
Três outras matérias, publicadas em veículos diversos, apontam uma relação entre a deficiência na educação do país e a má formação dos professores. De acordo com Nóvoa (1999), os professores no novo milênio são postos, principalmente pelas organizações internacionais, no centro da política, como chaves para resolver os problemas de um país. Esse discurso, porém, e é esta a tese defendida pelo autor, vem acompanhado de uma pobreza de políticas educacionais efetivas por parte dos governos nacionais. O excesso dos discursos, diz o autor “esconde a pobreza das práticas políticas”.
Os professores são visto com desconfiança e considerados profissionais medíocres. A mídia, por sua vez, possui um papel na repercussão desta ideia, produzindo um discurso ambíguo e hipócrita em relação à profissão. As matérias recolhidas são bons exemplos deste discurso, que é composto por análises de índices publicados tanto por organizações ligadas ao Ministério da Educação, como por organizações não governamentais que tem como foco a educação. Índices que na maioria das vezes mostram as deficiências da educação brasileira, para as quais a mídia informa originam-se na má qualidade da formação dos professores.
Vale notar, também, que uma das matérias, a publicada no site Terra, apresenta os resultados de uma pesquisa produzida pelo instituto Ayrton Senna, em conjunto com uma grande corporação de consultoria norte-americana, a Boston Consulting Group acerca dos entraves para a formação de professores no país, comparando as políticas públicas propostas para a solução destes problemas com modelos estrangeiros de países como a Finlândia e os EUA.
Conclusão
A partir das matérias analisadas, podemos concluir que o que a mídia informa sobre a formação docente é o mesmo que descreve Nóvoa (1999) na citação abaixo. Para o autor, os professores são vistos pelos mass-media e pela sociedade com…
Desconfiança, acusados de serem profissionais medíocres e de terem uma formação deficiente; por outro lado, são bombardeados com uma retórica cada vez mais abundante que os considera elementos essenciais para a melhoria de qualidade do ensino e para o progresso social e cultural. (Nóvoa, 1999, p.14)
E é exatamente esse o substrato que permeia as matérias publicadas e os planos políticos instituídos pelo governo. Em qualquer entrevista que os meios de comunicação realizem acerca da educação, os professores são os últimos a serem consultados, sendo privilegiado um rol de doutores e especialistas que nunca estiveram numa sala de aula ou tiveram contato com jovens do interior ou das periferias das grandes cidades do país. Apesar disso, os meios de comunicação elegem os professores como os grandes salvadores da sociedade moderna, como os únicos capazes de melhorar a qualidade do ensino e da cultura.
Enfim, essa dicotomia no tratamento conferido ao professor pela mídia e pela sociedade cria um enorme obstáculo para a melhoria da qualidade de aprendizagem das novas gerações. Sem autonomia e dependente de especialistas, que possuem sempre a palavra final acerca de seu trabalho, os professores perdem a capacidade de criar métodos pedagógicos inovadores. Além disso, a “centralidade” do professor não passa do papel, visto que diversos planos governamentais são criados, mas, na prática, a educação contínua como uma das áreas que menos recebe investimentos públicos, sofrendo, ano após ano, cortes e sucateamentos.
Rio de Janeiro, 14 de julho de 2016.
Referências Bibliográficas
NÓVOA, António. Os professores na virada do milênio: do excesso dos discursos à pobreza das práticas. Palestra proferida na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, 1999


1: Aluno de licenciatura em Letras Português – Literaturas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro
2:Aluno de licenciatura em Letras Português – Inglês pela Universidade Federal do Rio de Janeiro
3: Aluna de licenciatura em Letras Português – Literaturas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro
4: Aluna de licenciatura em Artes Plásticas, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro