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Politicas educacionais na imprensa

14 de jul. de 2016

A REPRESENTAÇÃO DA MÍDIA SOBRE O PAPEL DO PROFESSOR NO USO DE NOVAS TECNOLOGIAS

A REPRESENTAÇÃO DA MÍDIA SOBRE O PAPEL DO PROFESSOR NO USO DE NOVAS TECNOLOGIAS
Beatriz Nascimento¹
Isabela Fontenelles²

O presente trabalho é resultado de uma pesquisa que procura compreender como a imprensa constrói, em suas matérias, uma representação a respeito do papel do professor no uso de novas tecnologias– TICs. A pesquisa foi desenvolvida na disciplina de Profissão Docente, na Universidade Federal do Rio Janeiro, no período de 2016.1, sob a orientação do professor Armando Arosa. Ela se deu de maneira exploratória utilizando, para a construção do corpus, sites de reportagens como O Globo, Veja, Nota 10, entre outros, os quais em sua maioria foram encontrados através do blog sobre Políticas educacionais na imprensa brasileira, coordenado pelo professor. Estas reportagens, apesar estarem totalmente relacionadas às políticas educacionais, apresentam tópicos que reforçam a supervalorização das tecnologias em relação ao trabalho do professor.
Tendo em vista as representações atuais da mídia sobre o trabalho do professor relacionado ao uso de novas ferramentas tecnológicas e os estudos sobre este tema nas aulas de profissão docente de 2016.1, este trabalho visa, além de discutir tais temas, contribuir para a compreensão das imagens que a imprensa apresenta sobre o papel do professor no uso de novas tecnologias. É importante observar tais aspectos de forma crítica. Sutilmente, a mídia utiliza elementos que podem enaltecer ou desvalorizar o papel do professor, o que se torna ainda mais visível quando relacionado ao uso de ferramentas que vem ocupando o papel do mesmo em muitos contextos. Desta forma, queremos descobrir quais elementos a imprensa utiliza para promover esta representação do professor relacionada ao uso de novas tecnologias no ensino e o que ela afirma como verdadeiro sobre o papel do professor nesta relação.

A Tecnologia e o Ensino

É inegável a inserção da tecnologia na vida cotidiana da maioria da população. Dados do IBGE apontam que quase metade da população brasileira possui acesso à internet e 57% já utiliza internet através de tablets e smartphones. Ao observar não somente os dados, mas principalmente a realidade da presença da tecnologia ao nosso redor, é preciso pensar em como a nação lida com sua inserção no ensino.
Estudos atuais defendem o chamado letramento digital, como algo extremamente necessário a ser incluído na educação. Wielewick (2015) defende que o uso de tecnologias em sala de aula colabora para a educação universal garantida pela constituição, pois ela, além de facilitar o ensino para alunos com dificuldades de aprendizagem na forma regular, proporciona diferentes possibilidades de ensino para alunos que possuem necessidades especiais. Por exemplo, há uma grande quantidade de alunos hiperativos ou autistas que conseguem compreender narrativas apresentadas em aparelhos multimídia, mas não conseguem se concentrar em livros escritos. Para ela, o uso de novas tecnologias colabora para um ensino pluralista em que alunos de ensino regular e com necessidades especiais conseguem conviver em uma mesma sala de aula, tendo ambos acesso a um ensino eficaz.
Por outro lado, a autora também aponta que os alunos já chegam à sala de aula com seu conhecimento prévio, o qual, em muitos aspectos, está ligado com essa esfera digital. Crianças de 2 a 3 anos já conhecem muito mais um celular do que o alfabeto. Muitos desses alunos, por exemplo, conseguem compreender narrativas presentes em jogos, porém não aquelas presentes em livros escritos. Isso prova que o professor precisa saber lidar com essa realidade em sala de aula de forma eficaz para a aprendizagem do aluno.

A inserção das TICs em sala de aula

À medida que os jovens estão cada vez mais associados às novas tecnologias e ao compreender que o uso destas pode ser uma alavanca para a obtenção de um bom rendimento, o sistema educacional propõe enquadrar ao uso das mesmas, de maneira que o ensino se torne mais estimulante para o aprendizado do aluno. A forma como o sistema educacional incorpora as Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) pode afetar diretamente na diminuição da exclusão digital existente no país, pois essa incorporação no ensino tem o poder de inserir tanto alunos quanto professores no mundo tecnológico.
No que se refere ao espaço escolar, Rojo (2012) afirma que “precisamos pensar um pouco em como as novas tecnologias da informação podem transformar nossos hábitos institucionais de ensinar e aprender” (página), pois o uso de tecnologias dentro da sala de aula pode ser uma importante ferramenta de pesquisa, por exemplo. Entranto, é necessário deixar claro que a tecnologia deve ser vista como ferramenta e o professor o profissional a lidar com esta, e não o contrário.



A problemática no excesso de discursos sobre as TICs

Apesar de o uso das TICs ser bem visto por vários estudiosos como Vera Helena Wielewick e Roxane Rojo, pois de fato são ferramentas importantes e com poder transformador, é necessário observar com cuidado e atenção esse discurso de inovação nas práticas pedagógicas. António Nóvoa (1999) aponta aspectos, ainda presentes em nossa sociedade, relacionados ao papel do professor, os quais refletem a retórica do desempenho deste na construção da “sociedade do futuro”. O autor critica esse “excesso de futuro” nos discursos educacionais e afirma que isso é um reflexo de uma “falta de presente”, ou seja, estes discursos estão preocupados com, por exemplo, a tecnologia a ser inserida em sala de aula, mas não se preocupam com o ensino atual e como ele tem se desenvolvido. De acordo com ele, estes discursos a favor do “excesso de futuro” atrapalham o trabalho do professor no presente. Ele afirma que a “tecnologização do ensino” leva, inevitavelmente, a “uma secundarização dos professores, ora obrigados a aplicarem materiais curriculares pré-preparados, ora condicionados pelos meios tecnológicos ao seu dispor. O reforço de práticas pedagógicas inovadoras, construídas pelos professores a partir de uma reflexão sobre a experiência, parece ser a única saída possível” (p. 12). Desta forma, o professor por muitas vezes se torna refém da tecnologia, pois ela é imposta como superior ao trabalho do professor, como se este só pudesse desenvolver um bom trabalho através delas.
Essa questão está estritamente relacionada com os discursos sobre a formação do professor. Para a sociedade atual, um professor bem formado é aquele que utiliza com propriedade diversas tecnologias no ensino. O professor é visto como um profissional que precisa se reinventar frente à inovação imposta no ensino. Os professores que optam por não utilizar as TICs em suas aulas são visto muitas vezes como despreparados, mal formados, ou que, até mesmo, não se atualizam. É claro que existe sim uma parcela de profissionais que não utilizam tais ferramentas por não as conhecerem, e principalmente por não haver recursos para que eles as utilizem de forma produtiva. A tecnologia, quando aplicada eficientemente em sala de aula, é apenas uma ferramenta que pode auxiliar o trabalho do professor, pois ela deve estar a favor dele. Entretanto, este excesso de discurso em prol de novas ferramentas tecnológicas no ensino promove uma inversão de papéis no qual a tecnologia se torna agente e o professor paciente.

A metodologia de pesquisa

Os discursos sobre o uso das TICs na educação são heterogêneos, principalmente quando este assunto é discutido em sites de reportagens online. A depender do público-alvo e do objetivo escolhido pelo autor, as reportagens oscilam entre as que valorizam e as que desvalorizam o professor ao representa-lo nas notícias. Para promover uma pesquisa exploratória, procuramos estabelecer como critério de pesquisa reportagens que abordassem o uso das TICs em sala de aula e que também abordassem o papel do professor neste processo. Nossa pesquisa se iniciou em sala de aula e a maioria dos sites analisados foi encontrada através do blog Políticas educacionais na imprensa brasileira do professor Armando Arosa (UFRJ). Para observar a diferença entre as reportagens, fizemos um recorte temporal entre o ano de 2012 e o ano de 2016. Decidimos pesquisar reportagens relacionados ao tópico educação e tecnologia entre estes anos para comparar a progressão entre reportagens de um mesmo site e de sites diferentes. Fizemos uma tabela para as reportagens encontradas e as organizamos por: ano, título, autor, fonte, destaque (trechos do que mais nos chamou atenção para a pesquisa) e aspecto (se apresenta um papel positivo ou negativo do professor). Ao organizarmos as informações escolhemos algumas matérias para destacar neste trabalho. Nossa pesquisa tem como objetivo identificar quais elementos a imprensa utiliza para promover a representação do professor relacionada ao uso de novas tecnologias no ensino e o que ela afirma como verdadeiro sobre o papel do professor nesta relação. Tanto os endereços dos sites selecionados para nosso recorte de análise quanto o blog de pesquisa estarão disponíveis em anexo, porém somente sete matérias serão analisadas no presente trabalho, pois estas refletem aspectos mais explícitos que colaboram para o objetivo de nossa pesquisa.

A imprensa e a representação do papel do professor no uso das TICs

Após determinar nosso objetivo de análise e critérios de pesquisa, encontramos vinte e uma reportagens que apareceram entre os anos de 2012 e 2016. Ao analisar essas reportagens, observamos que, apesar de todas colaborarem para a análise, sete delas apresentam maior explicitação de diferentes aspectos relacionados à representação do papel do professor quanto ao uso das TICs. Seguindo na análise, percebemos que as reportagens se dividem entre as que apresentam o professor de forma positiva e as que o apresentam de forma negativa. As que o apresentam de forma positiva abordam um equilíbrio no uso das TICs na educação. Elas apresentam a figura do professor como mediador no ensino e mostram que as tecnologias são ferramentas subordinadas a ele, as quais podem o auxiliar no seu trabalho. Por outro lado, as que o apresentam de forma negativa supervalorizam o uso de novas tecnologias no ensino, desqualificam o professor e seu papel, ou, até mesmo, nem abordam o papel do professor neste processo.

A representação negativa do papel do professor

O corpus selecionado para análise, em sua maioria, contém reportagens que se dispõem de aspectos comuns como a abordagem das novas tecnologias. Dos vinte e um sites encontrados, apenas um terço apresenta um aspecto positivo na representação do professor; todos os outros diminuem ou deturpam o papel do educador. Uma das reportagens quem mais nos chamou atenção foi a que possui como título “‘Escola deve usar redes sociais com foco educativo’, diz especialista” presente no jornal O Globo, escrita por Gabriela Belém e postada em 5 de setembro de 2012. A notícia é baseada em um congresso de tecnologia e educação que ocorreu na mesma época em Recife. A reportagem ressalta a importância da inserção das TICs na educação e aponta o professor como um dos empecilhos para esta inserção efetiva. Ela entrevista a mestranda em Educação para Ciências e graduada em física Rosana Cavalcanti, a qual afirma que “os próprios professores não utilizam as redes sociais entre si, [e que] se conseguíssemos incluí-las já no currículo da formação inicial dos docentes, seria ideal”. A mestranda continua, afirmando que “o professor não é mais o único detentor da informação. Ele tem de aprender a conviver com isso e precisa ter a noção de que não sabe tudo. É uma área que ainda terá muitos desafios pela frente”. Esses são alguns dos trechos presentes nesta reportagem que retratam o educador como um profissional orgulhoso, teimoso, incompreensível e limitado. Além dela, a autora entrevista outras pessoas ligadas à área da educação, os quais a autora denomina “especialistas”. Assim como Rosana, estes apresentam somente uma perspectiva negativa sobre o professor e seu trabalho atualmente quanto ao uso das TICs. Entretanto, em momento algum a autora entrevista os próprios professores e alunos envolvidos nesta dinâmica.
Outra reportagem interessante que encontramos foi a que afirma que o “Governo falha ao introduzir tecnologia na escola”. Esta reportagem foi veiculada pela revista Veja em 20 de junho de 2012, escrita por Paula Reverbel. A reportagem se inicia com um subtítulo informando que sua constatação é baseada em uma pesquisa feita pelo Cetic.br (Centro de Estudos sobre as Tecnologias da Informação e da Comunicação). A notícia se apresenta inicialmente de forma expositiva sobre a pesquisa, porém, ao longo do texto, ela vai se desenvolvendo de forma argumentativa. A falta de uso das TICs em sala de ela é um absurdo; os professores são apresentados como aqueles que deveriam obrigatoriamente utilizar esses matérias, entretanto não o utilizam. Ela relata que “podemos constatar que a adoção de tecnologia nas salas de aula não aumentou, apesar dos esforços do governo” e ainda destaca que “os professores de escolas públicas brasileiras quase não utilizam recursos tecnológicos – como computadores e internet – nas atividades mais realizadas em sala de aula”. O professor, além de não possuir voz na reportagem para se defender das afirmações ou, até mesmo, apresentar outra perspectiva sobre o assunto, ele também é tratado como um dos, ou o principal culpado, para o déficit de letramento digital na escola. A tecnologia, assim, se configura na reportagem como extremamente necessária a ser aplicada em sala de aula, além de se sobressair ao papel do professor.
Além destas, encontramos também reportagens que omitiam o papel do professor como uma veiculada pelo jornal O Estado de São Paulo em 11 de abril de 2013 cuja manchete é “Ensino freia adaptação ao mundo digital”, escrita por Jamil Chade. Como na maioria das notícias, esta reportagem se inicia apontando dados de pesquisas sobre a educação no Brasil e no mundo. Entretanto, a diferença é que esta notícia, apesar de falar sobre as tecnologias de informação, em momento algum falar sobre o professor. O educador é totalmente omitido na reportagem, o que reforça a representação negativa do mesmo.
A notícia que mais ressaltou uma representação negativa do papel do professor foi a reportada pelo Correio Braziliense em 16 de fevereiro de 2016, cuja manchete é “Opinião: a raiz de nossas crises”. Ela começa afirmando que o Brasil fracassa na educação e, para sustentar este argumento, ela aponta avaliações oficiais que comprovem esta afirmação. Porém, em momento algum a reportagem relata que avaliações são essas; de onde elas vêm ou o quê investigam de fato. A notícia desencadeia uma série de críticas à educação sem base alguma, sem dados nem referências. Nela é relatado que “os métodos de ensino estão distantes da forma como aprendemos hoje. Avanços tecnológicos que vêm impactando nossos hábitos e trabalhos não são utilizados [na escola]”. Ainda falando sobre a tecnologia, a reportagem relata que “o acesso à internet é praticamente inexistente [em sala de aula]. Novas descobertas das neurociências não influenciam as ações pedagógicas. Habilidades e competências essenciais para a vida são alijadas dos planejamentos de aulas”. O interessante é observar que todas essas afirmações parecerem estar pautadas somente na opinião do autor. Não há base para estes argumentos. Há uma série de opiniões infundadas sobre a educação e que reforçam uma imagem negativa do docente. A reportagem ainda reforça esse aspecto ao propor uma avaliação do trabalho do professor. Ela declara que os “professores, em geral, são pessoas idealistas, que se sentem desestimulados e incapazes frente ao sistema atual. (...) Macrotendências mundiais na didática, como aprendizagem baseada em projetos, personalização e gamificação são pouco conhecidas e falta infraestrutura para sua utilização”. Através destas afirmações o autor, além de colocar em questão a formação e preparo do professor, o retrata, assim como em outras reportagens, como um profissional desestimulado e ignorante.
Estas reportagens caracterizam o panorama atual da mídia sobre a representação do papel do professor frente às novas tecnologias de ensino. Estas são somente algumas dentre as que encontramos que supervalorizam o uso de tecnologias em sala de aula, como se as tecnologias fossem a primazia no ensino. Como consequência desta supervalorização, o professor é negativamente representado ou, até mesmo, não é referido nas reportagens. O educador parece ter seu papel transformado em um simples agente em sala de aula que fica às margens das decisões e deve somente atender o que o governo ou “especialistas” aconselham sobre a educação. O professor não possui voz nas reportagens, muito menos os alunos, pois o interessante para a mídia é basear-se em pesquisas (com fontes ou não) e em “experts sobre educação”. O trabalho do educador sempre é visto como precário ou insuficiente e ele é, na maioria das vezes, retratado como um ignorante privado de melhores condições para viver e trabalhar.



A representação positiva do papel do professor

Embora uma quantidade expressiva e dominante de reportagens abordem uma representação negativa do papel do professor quanto ao uso das TICs, há aquelas que apresentam essa relação e representação de forma equilibrada e positiva. A imprensa tem mostrado o espaço que as TICs vêm ocupando dentro do ambiente escolar e como os professores vem encarando essa nova realidade que é tão tecnológica. Perante relatos da imprensa entre 2012 e 2016 investigados neste trabalho, é possível observar que entre os anos de 2015 e 2016 esta representação positiva do professor quanto ao uso de novas tecnologias na educação se intensificaram, pois a imprensa parece estar mais ciente do papel central do professor na educação como mediador do conhecimento e que vai muito além do uso de novas tecnologias.
A reportagem intitulada “Professor fluminense destaca as opções que a tecnologia oferece para melhor ensinar”, veiculada pelo Portal MEC em 29 de setembro de 2015, aborda uma entrevista com o professor William James Erthal – professor de uma escola municipal da região serrana do Rio de Janeiro – o qual defende que o uso de tecnologias proporciona inúmeras possibilidades na sala de aula, principalmente como elemento integrador, facilitador e disseminador do processo de ensino-aprendizagem. Ele ainda enfatiza: “Com os equipamentos modernos e a internet cada vez mais veloz e acessível, tanto a comunicação quanto a busca por informação e a construção do conhecimento têm que ser apropriadas e aproveitadas pela escola”. Erthal fala sobre a importância que há em saber quando é o momento necessário de se fazer o uso dessa ferramenta que é a tecnologia: “Agregar a tecnologia à prática não é um fim em si, mas um instrumento na construção do conhecimento”. Esta reportagem valoriza o papel do professor e apresenta a tecnologia como ela verdadeiramente é: um instrumento que pode ser utilizado pelo educador em sua prática de ensino.
Outra entrevista que apresenta essa relação professor-tecnologia de forma equilibrada é a veiculada pelo jornal Nota 10 em 28 de setembro de 2015 cujo título é ”Curso capacita professores para o uso de recursos tecnológicos”. Na reportagem há uma entrevista com a professora Rose Cerny, a qual relata que há um grande desafio no uso da ferramenta tecnológica, pois não há uma implementação dos usos de tecnologias dentro do currículo da escola, muito menos uma reflexão sobre um uso consciente destas. Desta forma, o professor não consegue associar as TICs ao seu trabalho como recurso pedagógico que colabore no ensino-aprendizagem do aluno. Segundo ela, o objetivo é “formar educadores para integrar, crítica e criativamente, as tecnologias digitais de comunicação e informação aos currículos escolares” e não apenas usar essa tecnologia sem ter um planejamento da aula. Reportagens deste tipo, apesar de defenderem o uso das TICs, parecem se mostrar conscientes que elas devem ser trabalhadas como ferramentas para o auxílio do professor.
A imprensa, desta forma, tem acompanhado os programas criados pelo sistema educacional que tem como objetivo capacitar o professor, não só no manuseio de equipamentos como smartphones, tablets, computadores, etc, como também, oferecendo possibilidades de uso significativo dessa tecnologia para potencializar o processo de geração de conhecimento. Dessa forma, o professor aprende a utilizar esses equipamentos da forma como os alunos utilizam, incrementando com sua própria experiência e mostrando aos alunos o potencial inexplorado dessas ferramentas.
Além disso, essas reportagens, apesar de poucas em número, apresentam com maior propriedade a voz do professor e sua opinião sobre o assunto. O site Porvir, por exemplo, apresenta uma notícia, no dia 2 de março de 2016, intitulada “Professora supera internet lenta e ajuda turma a criar jogo campeão”. Esta reportagem, além de valorizar o uso de tecnologias em sala, consegue apresentar o importante papel do educador ao mostrar a opinião da professora e como ela utilizou a tecnologia como ferramenta no ensino. Desta forma, seu papel é preservado na reportagem como mediadora central nesta relação e não como um agente à margem das decisões.
É claro que as reportagens de maior veiculação, sejam de aspectos positivos ou negativos sobre o professor, valorizam o uso de tecnologias em sala de aula para atraírem os leitores curiosos por novidades. Todavia, algumas delas, principalmente as mais atuais, apresentam esta relação entre a tecnologia e o professor de forma mais equilibrada. As que apresentam esse aspecto o qual denominamos positivo procuram falar sobre as TICs lembrando sempre que o professor tem o poder sobre essas tecnologias e que elas são apenas instrumentos, muito interessantes por sinal, para auxiliar no processo de ensino-aprendizagem. Há ainda muitas controvérsias no uso das inovações tecnológicas para a educação, porém é interessante encontrar entrevistas que apresenta essa valorização das mesmas de forma balanceada.

Conclusão

Assim como Wielewick (2015) compreende, acreditamos que as TICs devem ser empregadas em sala como ferramentas que podem auxiliar o trabalho do professor com alunos com necessidades especiais e alunos que não conseguem aprender nos moldes tradicionais. A tecnologia pode colaborar de forma positiva com o trabalho do professor e auxiliar alunos a compreenderem de formas diferentes e descobrir “novos mundos” através dela. Contudo, o professor deve ter preservado seu papel central nesta relação. A mídia, com seu poder informativo de massas, através das suas reportagens, pode colaborar com a valorização do professor e consequente melhora no ensino ou não. Quanto mais os discursos sobre educação enfatizarem o futuro, abordando novidades nas práticas de ensino, mudanças e tecnologias, por exemplo, mais haverá uma falta de “presente” (NÓVOA, 1999). É necessário pensar no uso das TICs sem desprezar a educação atual, como ela se dá, como ela se deu ao longo dos anos. Somente observar os pontos negativos não auxiliará na construção de uma educação melhor. Não se pode desprezar o papel do professor, seja em qualquer nível de ensino, como agente principal na educação. E ao retratá-lo de forma negativa, os veículos midiáticos intensificam ainda mais esse descaso real com o professor, o que pode gerar drásticos resultados na educação.
Conforme discutido anteriormente, Nóvoa (1999) afirma que o excesso de discursos sobre a tecnologização do ensino colabora para o cerceamento do trabalho do professor, o qual se sente obrigado a utilizar a tecnologia a qualquer custo para atender a exigências superiores a ele. Não é interessante utilizar a tecnologia de forma produtiva; o que a mídia propõe é simplesmente utilizar a tecnologia a qualquer custo, pois, para ela, os alunos necessitam estar informados e se sentem desmotivados com o ensino tradicional. A mídia apresenta a tecnologia como proposta irrecusável, pois é extremamente importante para um ensino eficaz. A mídia ignora todo o preparo do professor e sua capacidade de ensinar com tecnologia ou não. Ela reforça o aspecto da tecnologia como parte atuante na educação e o professor como paciente, à margem das decisões. Uma vez que a tecnologia ocupa o papel central na mídia, o professor se torna cada vez mais desvalorizado e mal representado.
A partir da análise do recorte temporal e do conteúdo do corpus, concluímos que as reportagens mais antigas tem tendência a representar o educador de forma negativa quando relacionado às novas ferramentas tecnológicas. Já os grupos de reportagens mais atuais, como os dos anos de 2015 e 2016, apresentam uma parcela de reportagens que parecem estabelecer um equilíbrio na representação da relação entre professor e tecnologia, pois o representam de forma positiva. As notícias que o representam de forma negativa tendem a centrar no despreparo do professor, na urgência de novas tecnologias e na aprendizagem eficaz somente através das TICs, apresentando o educador como algo periférico na educação, pois ele é quem deve se adequar às tecnologias. Além disso, essas reportagens não apresentam a opinião do professor, muito menos a dos alunos, pois valorizam as novas medidas adotadas pelo governo e as opiniões de “especialistas” na área da educação. Por outro lado, as notícias que representam o professor de forma positiva tendem a ressaltar o papel do professor como agente central e mediador. Elas, apesar de ressaltarem a importância da tecnologia, apresentam a função desta de forma clara, ou seja, afirmam que a tecnologia é apenas uma ferramenta nas mãos do professor que pode ser utilizada para auxiliar na educação, se abordada de forma consciente e crítica.
Entretanto, as reportagens que exibem essa representação positiva ainda são uma parcela bastante inferior quando comparadas às que representam o educador de forma negativa. Apesar de haver atualmente reportagens que apresentam um equilíbrio nessa relação professor-tecnologia, a grande maioria das reportagens, mesmo atualmente, ressalta o valor das tecnologias, desvalorizando o papel do professor. É essencial, portanto, adotar uma leitura crítica das notícias que circulam nas mídias, antes que informações e leituras incorretas, como a representação negativa do professor, corrompam ainda mais o papel de um profissional tão importante e essencial em nossa sociedade.


REFERÊNCIAS
NOVOA, António. Os professores na virada do milênio: do excesso dos discursos à pobreza das práticas. Educ. Pesqui. [online]. 1999, vol.25, n.1, pp.11-20.
ROJO, Roxane. Pedagogia dos multiletramentos – Diversidade cultural e de linguagem na escola, p.11-31. In: Multiletramentos na escola. Organizadores: Roxane Rojo e Eduardo Moura. São Paulo: Parábola Editorial, 2012.
WIELEWICKI, V. H. G. “Narrativas multimodais e possibilidades para uma educação pluralista”. In: TAKAKI, N. H.; MACIEL, R. F. (Orgs.). Letramentos em terra de Paulo Freire. Campinas, SP: Pontes Editores, 2015.
Site Valor: http://www.valor.com.br/brasil/4027294/ibge-mais-de-50-usam-celular-e-tablet-para-acessar-internet - acessado em julho/2016




Reportagens acessadas analisadas entre Maio e Julho de 2016:


1 – Beatriz Nascimento, graduanda em Letras Português/Inglês da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
2 – Isabela Fontenelles, graduanda em Letras Português/Inglês da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Rio de Janeiro, 14 de julho de 2016